Transcrição do Editorial do Diário do Nordeste do dia 6 de janeiro de 2012.

Estudos atuais estão comprovando as teorias defendidas pela velha geração dos engenheiros e agrônomos do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas, segundo as quais a açudagem contribuía para atenuar os efeitos da aridez no sertão. Em 1916, Arrojado Lisboa levantava a bandeira da necessidade de disseminação dos açudes públicos para elevar a pluviosidade do seu entorno, garantir o abastecimento das populações rurais, o plantio dos alimentos durante as estiagens prolongadas, as condições ambientais e a sobrevivência do sertanejo.

Agora, pesquisa concluída pela Empresa de Assistência Técnica de Extensão Rural do Ceará (Ematerce) comprova o acerto daquelas teses: os açudes aumentam o volume de chuvas nos municípios em que estão encravados. Faltou, contudo, entre os cientistas pioneiros da autarquia das secas, a exata compreensão sobre a necessidade de movimentar as águas para reduzir a evaporação.

As avaliações da Ematerce são conclusivas ao indicar que o acúmulo de água em grandes reservatórios influencia significativamente no aumento das chuvas em áreas abrangidas por vários municípios. Levantamentos comparativos dos índices de chuva, antes e depois da construção dos açudes Orós, na região Centro-Sul, e Castanhão, no Vale do Jaguaribe, demonstram a elevação da pluviometria em suas áreas de influência no Interior do Ceará. O fenômeno se repetiu em Quixeramobim, beneficiado também por um grande reservatório.

Quem visita o Açude do Cedro, em Quixadá, observa a diferença de temperatura ao longo do vale onde ele está encravado, contrastando com a elevada temperatura reinante nos monólitos de sua vizinhança. O Dnocs tem partilhado a gestão dos seus reservatórios com os governos dos Estados. Talvez resida aí o limitado aproveitamento dos grandes açudes na produção de pescado, dentro de padrões avançados de comercialização para corrigir os baixos índices de consumo de proteínas no Nordeste. O trabalho da autarquia das secas, ao longo de 75 anos de intensa atuação, resultou na construção de 274 reservatórios públicos e 586 particulares em parceria com os proprietários rurais. A partir da seca de 1932, instituiu o Serviço de Pesca e Piscicultura como base tecnológica para a produção pesqueira destinada ao consumo regional.

O objetivo era eliminar a carência de proteína animal entre os sertanejos. Empreendimento de grande porte, a ele faltou, para se viabilizar, a experiência da iniciativa privada. Pelo menos, 100 públicos açudes produzem peixes e crustáceos como tucunaré, tilápia do Nilo e do Congo, pirarucu, traíra, pescada do Piauí, curimatã, camarão e sardinha, comercializados nos grandes centros de consumo do semiárido. A escola de pesca desenvolvida pelo Dnocs poderia estar sendo empregada para elevar, em grande escala, o consumo de peixe produzido nos açudes, comercializado a preços compatíveis com o poder de compra das populações interioranas. No presente, seu potencial ainda é subutilizado.

O Ministério da Pesca planeja estimular o aumento substancial do consumo de peixe em termos nacionais. Aproveitar a elevada produtividade dos açudes, a diversidade das espécies e as condições favoráveis de água e clima seria uma maneira de explorar os recursos e a tecnologia disponíveis, sem necessidade de reinventar a roda. O Dnocs tem muito a oferecer para a formatação de um projeto que incremente a atividade pesqueira.

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